"(...)Não acontecia nada e o tédio não passava e ele sempre chegava em casa apenas pra ficar ali olhando o nada, sem nem conseguir dormir de tão vazio que se sentia. Até que naquele domingo, por algum motivo, a câmera em sua escrivaninha passou a lhe importunar profundamente. Com uma naturalidade um tanto bizarra, então, pressionou o botão vermelho e desligou-a, logo fazendo o mesmo com o resto das câmeras da casa – e pensando que muitos outros ao redor do mundo, e até mesmo muitos outros naquele edifício, tinham por costume fazer o mesmo de vez em quando; pensando que aquilo jamais poderia trazer-lhe grandes conseqüências.

Mas não."
O CARRASCO DE ÓRION

28.10.03

 

SOB O FIRMAMENTO

Este é o log da Morningstar, que traz para vocês a mesma coisa que verão em todos os outros, mas com meu toque especial. Aos interessados, além deste temos meu log ao vivo, meus arquivos de filmagens antigas (recentemente restauradas), arquivos de fotos (2 ou 3D), e de texto (com uma versão compacta para quem quiser baixar logo tudo).

17/11/2058.

SEXO DOS MONSTROS

Hoje de tarde, passado o estresse que vocês acompanharam pela HV, decidi refazer meu quarto para cobrir o espaço da sorveteria com algumas coleções de livros, particularmente uma do Instituto Campbell de Mitologia Comparada, de 2034, que fiquei bastante feliz em redescobrir. Pelo menos uma coisa que acabei lucrando. Como não fui ao trabalho - o Dr. Oxford foi mesmo muito compreensivo comigo, acho que ele me compreende muito bem - pude ficar revendo esta coleção enquanto a arrumava e esperava um sinal de vida de Eduardo. Ainda espero, pra ser sincera.

Fico curiosa de ver como nem os compiladores desta coletânea, que eram os melhores dos melhores do ramo, conseguiram se acertar sobre as versões de cada estória que deveriam ser usadas, cada um usa uma. Isso é especialmente fácil de se ver na parte de mitologia grega, que são 2 volumes inteiros dos 7 da coleção, o 3 e o 4, porque é a mais conhecida.

Por exemplo: em alguma altura do volume 4, diz-se que as Híades, filhas de Atlas, morreram de desgosto (como pode isso?) após seu irmão sofrer um acidente numa caçada. E subiram aos céus brilhando porque estavam chorando. Mas lá para o final do mesmo volume, quando um dos outros autores desenvolve seu trabalho sobre os mitos e as constelações, alega que as Híades subiram para formar a cabeça do Touro porque cuidaram de Zeus quando era um bebê. Ora, e desde quando isto explicaria o bendito Touro?

Este mesmo autor discute o outro pedaço da constelação, as Plêiades. Segundo ele, eelas foram para lá para fugir de Órion, que as desejava, e também desejava à Ártemis, a quem elas acompanhavam sempre. Certo, mais tarde Órion seria morto, mas antes disso elas fogem para o céu, onde, olha só, o mesmo Órion, também constelação, as persegue até hoje. Isto claro se não levarmos em conta uma autora anterior, do volume 3, que ao tratar de Electra, uma das Plêiades, conta-nos que ela e suas irmãs se mataram em homenagem à morte de suas meio-irmãs Híades - muito estúpido da parte delas. E que Electra teria ficado irritada com qualquer outro assunto mundano envolvendo um Touro em algum nível, e passado a ficar na rabeira da constelação, e menos brilhante. Hmmm...

Mas enfim, a coisa mais interessante e bela que encontrei enquanto revia estes volumes, foi uma versão recentemente (recentemente na época da coleção, entenda-se) descoberta sobre a lenda do Minotauro, segundo a qual "ele" seria na realidade metade mulher, e Teseu teria não assassinado a criatura, mas copulado com ela, cópula proibida que acarrataria ao final a morte do(a?) monstro. Este sim é um detalhe muito interessante, mas mais interessante ainda porque mostra a preocupação dos estudiosos e compiladores com os detalhes. O que faz com que seja ainda mais estranho o modo como discordam a respeito deles. Eis aí um pessoal que acha interessante vasculhar e pesquisar o sexo dos monstros. Lembro-me de como o Heitor gosta de dizer que isto é inútil, que eles estão discutindo o detalhe e perdendo o significado profundo, mas não os culpo; pensando no tempo que dediquei a esta e outras coletâneas de livros, acho que fiz o mesmo, porque é de fato muito prazeiroso.

E afinal, pra que possuímos e colecionamos as coisas, se não para revê-las e nos entretermos com seus detalhes?

PS: Eu colocaria algumas das imagens do livro aqui, mas o scanner está com problemas. Mais tarde talvez eu o faça.

posted by Heitor 00:09

20.10.03

 
"O log de Soraia Vilas-Boas Marchon. 135.895 visitas nas últimas 24 horas.

20:03 hs. de 17 de novembro de 2058.

Corredor do 8° andar. Soraia, visivelmente irritada, toca a campainha do apartamento de Eduardo.

20:05 hs.

Sem resposta, ela insiste.

20:06 hs.

Novamente sem resposta. Ela pressiona a campainha com força e mantém o dedo nela até que, algumas dezenas de segundos depois, a voz de Eduardo soa no inter-vídeo-fone. A imagem na tela do aparelho permanece em branco.

EDUARDO (arrastando a voz): Quem é?
SORAIA: Eduardo vem até aqui fora, agora!
E: Quem é, porra?
S: Olha aqui, Eduardo, não fique pensando que vai vir me cobrar satisfação. Quem tem que cobrar satisfação aqui sou eu, viu bem?
E: Soraia?
S (zombando): "Hã, Soraia?" É, Soraia, não venha se fingir de desentendido, seu fudido! Eu sei que foi você que escrotou comigo!
E: Caralho, que segredão.
S: Escuta aqui. Você pode até achar que eu não consigo provar, mas eu sei que foi você.
E: Vai pra casa, Soraia.
S: Só porque fez aquela neozada com a câmera, você acha que tá limpo, mas eu vou fuder contigo.
E: Fiz o que?
S: Olha como é fingido.
E: Fingido? Olha, Soraia.
S: Mas não quer vir tudo bem, espera que eu já vou pra assembléia, mesmo, lá eu coloco esse assunto em pauta. Aí eu quero ver você fingir.
(ela faz menção de ir embora)
E: Fingir? Soraia, peraí, eu já vou, deixa por uma calça.
(A tela do interfone acende, mostrando Eduardo de costas, terminando de vestir uma cueca. Desenhos e fotos no chão, misturados com rolos de papel higiênico, papel higiênico amassado, e dois pilots, preto e vermelho.)
S (perplexa): Nossa. Olha só o seu quarto... que... que nojento. Você num tava?
E (vestindo uma bermuda): Não tava?
S: De quem é aquela foto? Isso são recortes dos logs? Puta merda, Eduardo, você num tava usando...? Você não tava...?
(a imagem dele some do interfone e em pouco tempo ele está abrindo a porta. Dá uma olhada para ela, para o monitor, depois para ela, de cima abaixo.)
E: Pensando em você? Imagine.
S (contraindo o rosto): Agh. (olhando novamente para ele, também de cima abaixo) Ah, Eduardo, olha, quer saber, você. Eu vou embora.
E: Não vai, não.
(ela tenta sair, ele a puxa pelo braço, depois solta levemente. Ela não se manifesta.)
E: Explica melhor essa história da câmera aí.
S: Que câmera?
E: Como é que eu vou saber?
S: Como vai saber, você é que neozou com ela!
E: Neozei nada!
S: Mas é muito fingido.
E: Não neozei.
S: Eu não acredito.
(os dois foram se aproximando enquanto discutiam)
E: Soraia. Eu. Não. Neozei. Porra nenhuma!
S: Eu sei que foi você.
(ele se afasta)
E: Eu não saberia neozar com uma câmera nem que eu quisesse. Por que acha que fico desligando a minha?
S: Por.
E: Por...? Vamo lá, por...?
S: Sei lá porque. Pra ganhar pop.
E: Pra ganhar pop. Sensacional. Soraia, eu não faço idéia do que você está falando. Me diz o que houve.
S: Alguém entrou na minha casa e queimou o meu edredom. E quebrou minha loja de sorvetes.
E: Nossa, que trágico. E a câmera?
S: Eduardo, eu não vim até aqui pra ficar aguentando gracinha sua. Eu dava importância praquelas coisas, tá?
E: A câmera?
S: Ficou em off por alguns minutos, cinco minutos, acho. Não, foram oito.
E: Só em off?
S: Ficou chuviscando também. Como é que você sabe?
E: Não sei, estou perguntando!
S: Não parece.
E: Mas é estranho.
S: Na certa não foi do jeito que você planejou, né?
E: Ah, calaboca. Só tô falando porque nessas situações geralmente a tela só fica escura ou pega uma imagem pré feita, o chuvisco é.
S: Você sabe fazer, foi você.
E: Não fui eu, eu entendo só um pouco disso.
S: Tá, pode continuar fingindo.
(Ele se aproxima dela novamente)
E: Não estou fingindo. Não fui eu.
S: Eu sei que foi.
E: Não fui.
S: Foi sim.
E (ele a agarra pelos ombros com força): Soraia entende uma coisa! Não. Fui. EU!
(abre o elevador. Sônia sai de dentro dele, agitada.)
SÔNIA: Ah, vocês aí. Meu Deus vocês não sabem.
E: Ah, a Soraia deve saber, ela sabe de tudo.
SON: Eduardo, não brinca. Foi horrível! A Assembléia ia começar, o Jorge foi chamar o Caio e. E.
E: E perceberam que era melhor ir pra Fud de uma vez?
SON: Eduardo, pára Eduardo! É sério! O Caio, ele. O Caio morreu!
SOR (a princípio assustada, depois lançando um olhar terrivelmente suspeito sobre Eduardo): Hã?

17.764 visitas no período analisado. Média 2,45% superior ao dia anterior. Parcela de 35,90% do total do dia."

"Pedido: registro de câmera de Sônia ... a partir das 20:25 hs. de 17/11/58. Procurando..."

posted by Heitor 23:50

8.10.03

 
Ela sabia que aquilo era mais do que aparentava. Não se espantava com isso, podia sentir em Soraia a ambição e a atenção ao mundo que a rodeava, muito semelhantes a ele quando mais jovem.

Na época em que trabalhava nos laboratórios da Z em Seattle, num setor extremamente despretensioso para o que Anna veio a descobrir, enquanto mexia nele.

Ártemis.

Ele mentira para Soraia quando dissera que sua equipe lá mexia com transgênicos; isto era apenas parcialmente verdadeiro. Ele tinha ido para lá com esta função, mas assim que o Ártemis foi descoberto, Ramirez, que chefiava o laboratório, deslocou a ele e sua equipe, junto com mais 10 cientistas, para trabalhar na descoberta.

Ele era, então, como Soraia, agora. E por isso temia por ela. Temia que ela viesse a cometer o mesmo erro que ele - viesse a querer tudo, recusar-se a perder uma pequena coisa que fosse e, com isso, perdesse tudo. Ou pior, como ele, criasse uma aberração.

O monstro que ela agora via no microscópio - sua criação, sua ponte pro sucesso, sua maldição.

* * *

A mensagem era curta, o papel fino e o logo da Z reluzia em cores nas suas costas: "Devolva-nos.", dizia.

- Que me dizes?

- Verdadeiro. - respondeu Ramirez, nivelando o papel ao olho. - Posso ver o código embutido no logo aqui. Ainda não conseguiram copiar.

- Eu quis dizer sobre o conteúdo da mensagem. - retrucou Oxford.

Ramirez devolveu-lhe o papel com delicadeza e um dar de ombros.

- Não é óbvio? Eles querem seu composto.

- Eu sei. Eu quero saber o que você acha disso.

- Não impediram você de usar o ártemis. Você está rico por causa deles. Agora querem a patente pelo seu remédio.

- E...?

- Devolva, ora. Você viu o que fizeram ao Guerra, assistente do Aécio, quando ele não devolveu a moto.

Oxford sacudiu a cabeça.

- Vamos Oxford, não seja estúpido. - prosseguiu Ramirez - Enquanto quase toda a equipe morreu, você saiu vivo, bem, está rico, famoso. Devolva a merda da patente. Vá pro Brasil e aproveite uma boa aposentadoria.

- Não é certo. É meu remédio. Meu.

- Não tente se enganar. Você sempre soube que seria assim. Devolva.

Oxford levantou a vista mais uma vez, e deparou-se com a escuridão dos olhos de Ramirez - duas poças negras que o fitavam de maneira profunda, alocados no meio de sua face fina, branca, magra. Havia algo que crescia ultimamente nele, e era extremamente perturbador; algo em seu olhar - seus olhos haviam sido sempre negros, mas não seu olhar. E seu linguajar nem sempre fora tão ríspido, nem seu modo de agir tão obcecado. Dizia a Oxford para desistir, mas ele mesmo nunca mais abandonara o projeto Ártemis.

- Por que você fala assim? Como se fosse certo eu dar a eles o que é meu?

- Certo? Ninguém falou em certo. Mas você não deveria se apegar tanto a algo.

- E você? Você até hoje trabalha com o Ártemis.

- O Ártemis não é meu, Oxford. E o Chronos não é seu. Devolva-o.

- Isto é uma ordem?

- Não. É um conselho.

Era estranho que, de todos os presentes no dia do teste, ele fosse o único vivo. Estranho que com tanto afinco o dissesse para desistir do Chronos.

- Você. Eles. Você está com eles agora, não é?

- Hã?

- Você está com a Z. Do lado deles. Você. Seu.

- Organize seu racioncínio, Oxford, você não está dizendo coisa com coisa. - Ramirez já nem olhava para ele, remexendo em alguns arquivos. - Parece até que mexeram na sua coleção de pratos, você fica assim mesmo, igualzinho.

* * *

Aquela foi a última vez que o viu, e o mais acertado conselho que podia ter recebido. Ele apegou-se ao maldito remédio, não o devolveu à Z.

E teve sorte. Ao contrário de Guerra, não foi morto, nem perseguido. Teve a liberdade de fazer o que quisesse com seu dinheiro e seu invento. Foi para o Brasil exercitar seus hobbies culinários, enquanto o dinheiro da venda alimentava seus cofres.

Até o dia em que alguém se infiltrou no seu banco de dados e apagou todos os registros do Chronos e do Ártemis. Pegou a amostra original - a única intacta - e fez... alguma coisa com ela, que a transformou num ...

Era um vírus? Uma bactéria? Não importava, para Oxford era mesmo um monstro. Ele se espalhou e infectou suas amostras, seus laboratórios, até mesmo suas lojas; não fosse aquele hacker bio-eletrônico, Mister D., talvez tivesse se espalhado e ficado muito pior. O tal D. conseguiu anular quase tudo do vírus - às vezes pensa que o sujeito possa ter sido enviado pela própria Z para controle de danos; jamais saberia ao certo - menos o original. Este, ele somente conseguiu prender num sofisticado receptáculo. Lembra-se bem de como o descrevera:

- Na verdade, é um bloqueio quase físico; é uma série de canais interligados de barreiras feitas de uma cadeia de carbono muito fina.

- E porque você não faz uma prisão com isso, tapa logo todas as saídas?

- Ah, o senhor não compreendeu. Ele pode derrubar essas barreiras a hora que quiser, sua consistência física é mais forte que elas, e ele é pequeno o suficiente pra passar por qualquer outra coisa que eu use. Mas eu as coloquei de uma forma que ele jamais saberá qual quebrar, porque não sabe onde fica a saída.

- Em suma, é um labirinto.

- É uma forma meio rústica para descrever algo tão sofisticado mas... sim, é um labirinto.

- Então, ele nunca mais vai sair?

- Nunca? Não diria isso. Pelo contrário. Ele tem uma taxa de crescimento que só pode ser detida por componentes presentes no coração humano, sabe?

- O que isso quer dizer?

- Quer dizer o que quer dizer, Doutor. O senhor é um homem esperto, e sabe que tudo tem um preço.

Tinha um preço. O preço de sua obsessão era pago a prestações, e as prestações eram as vidas de seres humanos - preferencialmente os corações de jovens mulheres, cujos efeitos eram mais duradouros.

Foi assim que conheceu Soraia, e não podia dizer porque a havia poupado. Podia ser porque tinha a sensação de que o destino a reservara outro tipo de provação; mas mais provavelmente era mesmo porque o lembrava tanto de si mesmo. Porque achava que, talvez, através dela, pudesse ter uma chance de se redimir - de extirpar aquela culpa horrorosa, e quem sabe um dia, livrar-se de seu monstro.
posted by Heitor 17:06

6.10.03

 

Pelo microscópio, o pequeno composto viral amarronzado mantinha uma forma estranha para sua estatura e tipo: havia duas protuberâncias surgindo de sua membrana levemente circular, afunilando-se como... Estava quase conseguindo distinguir o porquê daquela familiaridade.

- O que foi, Soraia? – indagou o doutor Oxford, surgindo pela porta direita. – Alguma coisa errada, falha no sistema?

- Não, não, nada. – ela tentou disfarçar sua crescente fascinação pelo fenômeno. – Só olhando.

Oxford não aparentava sua idade, fosse ela qual fosse – e devia ser muita. Não mesmo. Tinha pouquíssimos cabelos grisalhos, poucas rugas, muito tamanho e uma compleição física de causar inveja, ainda que fosse impossível ter inveja de alguém com um olhar tão melancólico.

- Bom, pode olhar, só não se aproxime demais da estrutura, é sensível. Vim apenas ver se havia alguma coisa a ajeitar antes de.

- Por que aqui?

- Hein?

- Por que o senhor deixa esse troço aqui?

- É interessante de ver, não é?

- Mas se é interessante, por que a despensa?

- Eu sei, olha.

- Por que o senhor não guarda num lugar mais exposto? Sei que é sensível, mas é só por um aviso.

- Não sei. – mentiu Oxford.

Era claramente mentira. Havia um motivo, ela tinha certeza, como tinha certeza de que ele jamais diria; que ia guardar qualquer que fosse sua mágoa consigo mesmo para sempre, como guardava sua coleção de pratos, seus livros de receita, ou aqueles velhos manuais de quando trabalhava com pesquisa de transgênicos nos EUA, mas fingindo que ela não estava lá.

E ia continuar com aquele terrível pressentimento toda vez que visse a figura amarronzada no microscópio.

posted by Heitor 23:19

 

 

 

 

Pop:

Weblog Commenting by HaloScan.com

A estória até agora (primeiro post em 22/07/2003):

07/01/2003 - 08/01/2003   08/01/2003 - 09/01/2003   09/01/2003 - 10/01/2003   10/01/2003 - 11/01/2003   11/01/2003 - 12/01/2003   02/01/2004 - 03/01/2004   03/01/2004 - 04/01/2004   05/01/2004 - 06/01/2004   06/01/2004 - 07/01/2004   07/01/2004 - 08/01/2004   08/01/2004 - 09/01/2004   09/01/2004 - 10/01/2004   10/01/2004 - 11/01/2004   11/01/2004 - 12/01/2004  

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O LAR DO CARRASCO

Local: Rio de Janeiro, Brasil.

Época: 2058 D.C.

Condições: As cidades e as pessoas não mudam - não no que interessa. Mas se você se preocupa com os detalhes, eis um glossário para os perdidos.

DRAMATIS PERSONAE

Aécio: tutor de Márcia, a quem acolheu e criou desde muito nova.

Alice: mais nova residente do edifício de Eduardo, onde ocupa o décimo primeiro andar. Razoável, amigável, tolerante, bem-humorada, dona de olhos muito claros. Ocasionalmente causa um asco terrível e inexplicável a ele.

Ana: mulher misteriosa que Eduardo encontra no Jason’s. Pálida, cabelos da cor do fogo e olhos de um escuro imenso, fala de maneira oblíqua, desaparece quando bem entende e parece conhecer todos os segredos. Samantha alega que ela mente ao dizer seu nome.

Big H: hacker investigado por Caio, cujos logs costumava alterar de maneira provocativa.

Caio: músico do andar acima de Sônia. Sentia falta de intimidade. Freqüentava forums sobre sexo. Andava mexendo com um hacker chamado Big H. Foi encontrado morto no próprio quarto, talvez assassinado; muitas suspeitas recaem sobre Eduardo. Este por sua vez acha que foi Ana.

Dr. Cristóvam Ramirez: proprietário dos laboratórios Ramirez, foi o cabeça do projeto Ártemis. Tentou dissuadir, em vão, Oxford a não fugir com o Chronos. Desapareceu alguns anos atrás. Tem predileção por vocábulos de negação.

Dr. Richard Oxford: dono do restaurante onde Soraia atualmente trabalha. No passado, foi parte da equipe do projeto Ártemis, trabalhando com Ramirez. Desenvolveu o Chronos, um potente agente contra o envelhecimento, que por sua vez gerou um vírus terrível que exige vidas humanas para ser contido.

Dra. Anna Ericsson: bióloga, suas descobertas levaram à criação do projeto Ártemis, o qual integrou. Sônia verificou pelos arquivos que ela tinha os olhos escuros.

Eduardo: fio condutor da narrativa, é mestre em circuitos tecno-orgânicos de precisão, artista plástico frustrado e famoso bem sucedido. Profundamente entediado, adquiriu os hábitos peculiares de desligar as câmeras do seu vlog, de encontrar-se com uma ruiva de olhos escuros, e de ser suspeito de homicídio.

Heitor: autor desta estória.

Higínio: vigia dos registros de logs. Trabalha para a Z, mas tem um supervisor direto de identidade ainda desconhecida.

Homem de Capote Marrom: estranho de olhos muito claros por quem Márcia sentiu-se atraída uma noite no Jason’s, mas com quem nunca nem ao menos travou diálogo.

Irene: mora abaixo de Eduardo. Tem uma constituição física frágil mas esteticamente perfeita. Acredita em explicações lógicas para os sentimentos, e que o amor é uma projeção. Gosta de discutir e prender os outros interlocutores em armadilhas de argumentação lógica; Eduardo é o único capaz de rechaçá-la, o que tem por hábito fazer.

Jason: inglês, dono do bar Jason’s, freqüentado por Eduardo, trabalhou para a Z na busca dos restos do veículo ARX-Maglev.

Jorge: Engenheiro termodinâmico, reside dois andares abaixo de Eduardo, com quem simpatiza. Aficcionado pela profissão, metódico, muito sério no que faz, tem surtos de escapismo frenético.

Márcia: vizinha de Eduardo, mora no 1° andar do prédio. Perdeu os pais e o irmão gêmeo ao fugir na ARX-Maglev, quando criança. Pensa pouco antes de agir. Adora vermelho.

Maria: síndica do prédio, reside dois andares acima de Eduardo. Autoritária. Irrita-se com facilidade.

Miguel: vizinho de Eduardo, mora no andar imediatamente acima ao dele. Está de viagem há um mês e meio e deixou uma procuração com Alice para as reuniões de condomínio.

Mr. D: bio-hacker, aparentemente sub-contratado pela Z ou pela Styx. Criou a trava de segurança do vírus que o Chronos gerou.

Raphael Pontes: romancista de renome, autor de “De Fogo e de Vento”, a quem Sônia e Márcia muito apreciam.

Rubens: vizinho do 5° andar de Eduardo, é o mais jovem residente. Provocador e arrogante, irrita muito a Alice.

Safada_23, Fernanda, Taíse, Bruno, Carol, Luísa, Netrap, Hentai_Princess, Sweet, O outro e Slayer: participantes do holo-fórum “Debatendo Sexo em Aberto”. Caio acredita que Slayer seja, na verdade, Ana, e que ela tenha lhe enviado bilhetes. Slayer declarou que Caio morreria se continuasse a bisbilhotar Big H.

Samantha: irmã gêmea de Sônia, com quem divide agora o mesmo corpo e vida. Terrorista, promoveu diversos atentados aos laboratórios Ramirez. Deixou várias anotações misteriosas para a irmã, que as enviou a alguém que assina como R.

Sônia: repórter, mora dois andares acima de Márcia. Não é filha de um mortal. Sacrificou metade de sua vida para salvar a de Samantha, sua irmã gêmea. Recebeu bilhetes misteriosos que desconfia terem sido feitos por Eduardo. Rói as unhas. Tem uma curiosidade suicida.

Soraia: vizinha de cima de Márcia, bióloga em formação educacional, mas atualmente trabalhando como chefe de cozinha para Oxford. Já foi objeto do amor de Eduardo, que ainda lhe guarda rancor pelo desprezo que recebeu em troca; atualmente acusa-o de destruição de propriedade e do assassinato de Caio, nessa ordem. Tem imensas coleções no apartamento e olhos castanhos muito largos. Não gosta que gozem em seu edredom.

Tiago: antigo amigo de Eduardo, com quem perdeu o contato, reside na cobertura de seu edifício, onde passa o dia rabiscando desenhos, poemas e semelhantes obras de arte. Quieto e alienado do restante dos moradores, tem um séqüito de lags extremamente fiel.

VOCABULÁRIO

- .sdr: abreviatura de system damage report (relatório de danos no sistema); usada para identificar um formato de arquivo que mistura voz, texto e imagem para reconstituir e avaliar eventos danosos a um sistema digital.

- Amp: formato de gravação áudio/vídeo digital que consagrou-se como o mais rentável de todos, e eventualmente tornou-se sinônimo da gravação. Note-se que, hoje em dia, a capacidade de armazenamento dos drives caseiros (que existem em grande quantidade, cada pessoa possui vários drives e para várias funções) é tão grande, a de compressão do amp tão pequena, e a transferência da rede para qualquer aparelho, mesmo um trimag, tão rápida, que só os mais preciosistas preocupam-se em transferir as amps que possuem para DVD. A maioria apenas mantém um backup e pronto.

- Analfa: burro, idiota, estúpido, aculturado, etc. Membro da classe baixa, em oposição ao apelido “Huxleyano” da elite (alfa). Gíria muito antiga que retornou ao jargão recentemente.

- Bal: prazer, satisfação breve e facilmente adquirida.

- Ecotec: aglutinação dos vocábulos “tecnologia” e “ecologia”. Todo utensílio ligado à preservação do meio-ambiente, particularmente os mais modernos.

- Escrotar: você pode imaginar o que seja.

Fabrique: da gíria francesa “fabriqué”, muito em voga nos idos de 2030. Adjetivo que designa artificialidade, algo “com cara de recém-saído da fábrica”, certinho, reto, perfeitamente angulado, quadrado.

- Fud: misto de boite, motel, prostíbulo e casa de jogos muito comum na noite carioca.

- Grito-Mestre: objeto, quase sempre um documento, de grande importância, ou contendo informação importante.

- HV: holovisão. Aparelho semelhante à TV, só que em 3D. O nome completo, em teoria, é Tele-Holo-Visão, mas ninguém usa esse termo, mesmo formalmente.

- Maltrão: membro da classe baixa (ralé). Termo levemente informal.

- Mercúria: micro-câmera voadora para uso pessoal, programada para rotacionar em torno do usuário e filmá-lo de ângulos diversos. Usada em conjunto com o trimeg, permite que o dono de um log seja acompanhado online realmente 24hs. por dia. O modelo e a logo-marca pertencem a Z.

- OC: abreviação de Oceania, conglomerado empresarial originariamente asiático que domina os mercados da produção artística (música, escultura, cinema, teatro – a mais decadente de todas, dança, escrita fictícia e documentária, em prosa ou verso, pintura, arte sequencial e interativa), além das tecnologias de transporte, agricultura, fornecimento de alimentos e congêneres. É encarregada do fornecimento de drogas e é a criadora do soma. Além disso, encarrega-se do que já foi o Poder Legislativo. Teoricamente, compete com a Z e a Styx, mas todos sabem que elas são parceiras no que concerne ao governo do mundo.

- Ouél: membro da classe econômica alta (elite). De conotação apenas levemente informal.

- Pé: membro da classe baixa (ralé). Termo razoavelmente pejorativo.

- Pop: uma ampliação do sentido de hoje em dia. Além de abreviação para “popular” e “popularidade”, é a unidade de medida de audiência, e usado para qquer coisa q envolva audiência ou fama em geral.

- Rap: adjetivo para escandaloso, chamativo, estiloso.

- Ritar: chamar, ligar para, “telefonar” (quase não se usa mais telefone desde a popularização do vídeofone); atingir, acertar, golpear.

RPC: abreviação de “rio pra caralho” (ou “rindo pra caralho”); inspirada no “laugh my ass off” americanos, é usado em conversas de texto da Rede como expressão de estado de humor do interlocutor, e denota, como se pode deduzir, riso intenso, quase incontrolável.

- Rúfer: chefão, homem de cima, quem manda; alguém que não abdica de uma vantagem.

Streamline: corrente em inglês, designa uma via de acesso de dados em rede.

- Styx: conglomerado empresarial europeu que domina todos os setores bio-medicinais e de extração mineral (da medicina à clonagem, do garimpo às Usinas Solares e Nucleares). Além disso, são encarregados dos serviços funerários e do que já foi o Poder Executivo local, isto é, exercido nas unidades federativas (prefeito, governador, etc.), visto q o Executivo Nacional não mais existe como tal. Teoricamente é competidora da Z e da OC, mas é fácil deduzir que elas, na verdade, auxiliam-se mutuamente para ditar o rumo da Nova Ordem Mundial.

Tiltado(a): pasmo, estupefato; catatônico.

Torre: denominação dada a um setor de armazenamento de informações digitais organizado em níveis.

- Trimeg: corruptela de 3mg, por sua vez abreviação de mini-multi-media gadget, descendente distante do celular que congrega as funções de videofone, videogame, reprodutor e gravador de arquivos de áudio e vídeo, câmera filmadora e fotográfica, além de transferência de dados usuário-usuário, e acesso completo à Rede. A tecnologia e a logomarca pertencem à Z.

- Z: o maior conglomerado empresarial do mundo, surgiu na América do Norte e dominou todos os setores de informática, comunicação, fornecimento de energia, navegação aero-espacial e, como se não bastasse, virtualmente todo o arsenal bélico do planeta. Controla a Justiça, a(s) Igreja(s), e os registros históricos, tanto em arquivo como em museu. Em teoria, compete com a OC e a Styx; alguns diriam que todas as 3 trabalham em conjunto para governar o planeta; mas não seria exagero nenhum dizer que é Z quem detém o poder de fato.

- Zerar: acabado, terminado, completo, como nos videogames, mas de uso mais amplo.

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O MANDANTE DO CRIME

Nome: Heitor Coelho

Idade: 76

Paradeiro: desconhecido

Formado em: Direito com pós-graduação em Astrologia Jurídica; Astronomia; Teoria da Levitação; Projeciologia.

Gosta de ouvir: sons das profundezas do inferno ou laranjas caindo no lodo, o que vier primeiro.

Livro: sua cara por um preço camarada.

Nas horas vagas: viagens ao Submundo.

Qual a intenção desse blog: contar uma boa estória. Não reparou, retardado?

Signo: adivinha.

Aí, galera do Megazine: vão se fuder!

Fale com o Heitor e ganhe um insulto grátis!